sexta-feira, 26 de novembro de 2010

metáfora de boteco


Meu copo ainda transborda. 
E por mais que eu beba, beba, beba e o copo continue sempre cheio, minha sede não é saciada. 
O líquido que ali está já não tem mais a mesma cor, nem o mesmo cheiro, nem o mesmo gosto. 
Mas ele está ali. Ele está. 
Só não mata mais a minha sede.

domingo, 21 de novembro de 2010

pessoas-remédio

Mesmo quando me vejo perdida no buraco negro originado da existência de diversos problemas que parece que insistem em aparecer todos juntos, de mãos dadas, dispostos a acabar com a minha raça, ainda assim, existem pessoas no mundo que me fazem esquecer de tudo.

Tem gente que tem esse dom. E é bem um dom mesmo, porque nem da vontade deles depende. Tem gente que só de existir já faz bem. Uma foto, uma lembrança... já são o bastante pra me fazer sorrir e ter um descanso do peso das encrencas.

Dessa última vez, vendo uma foto de uma pessoa distaaante que só, fiquei feliz e esqueci das dores do mundo. Pessoa boa, de coração grande e bom, de alma gigante, de alegria inacabável. Momentos (poucos e) bons, passei com essa pessoa, e neles me apego de quando em vez. E noutras vezes, me apego a outros momentos, vividos com outra pessoa divertida e alegre; e em outras me apego a uma outra, de uma amiga de infância e nossos momentos de infância. E assim, vou me apegando a pessoas queridas e lembranças boas, e me lembro ainda que há muitos momentos bons como aqueles me esperando na esquina do futuro.

sábado, 20 de novembro de 2010

fotografias do futuro

É um amor infinito que briga comigo pra permanecer dentro de mim.

É um dor que dói fininha, meio calada, meio mansa, meio inconformada com a conformidade que a sinto.

São buracos nos meus dias, buracos na minha vida. Espaços em branco, vazios. Me sinto perdida nesses espaços. Quando eles surgem no meio do meu dia, me sinto tão sem rumo, tão perdida, que é como se eu parasse de existir durante aqueles minutos, horas, tardes, noites, manhãs. Um buraco negro que suga parte de minha existência e some com ela pra sempre. 

É uma parte de mim que partiu, quebrou, esmigalhou, e não tem conserto. Mas tem cicatrização. E isso demora.

São fotografias perfeitas de palavras que nunca ouvirei, de uma casa que nunca arrumarei, de filhos que nunca terei, de datas que nunca celebrarei, de uma vida que nunca compartilharei, de um futuro que nunca será. Mas que já estavam no meu álbum.

É esse futuro todo cheio de detalhes, desenhado à mão, com carinho, com persistência, com dor, com alegria, com esperança. É ele perdendo suas cores, seus contornos, se esvaindo, chorando, escorrendo.

É simplesmente uma vontade de ficar ali, abraçada pra sempre, segura, amparada, existindo junto com meu amor infinito e minhas fotografias do futuro.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Rabo de Lagartixa

Sempre ouvi dizer que a lagartixa tinha o poder de regenerar o rabo - ou a cauda. Nesses dias nublados, andei pensando que seria bom poder ser uma lagartixa: poder regenerar meu pedaço perdido. Aí, fui pesquisar sobre essa tal regeneração (pra saber como funciona, né, vai que poderia dar certo pra mim também?!).

Lí que a lagartixa perde o rabo como mecanismo de defesa. Ela solta espontaneamente seu rabo pra chamar atenção do predador e poder fugir dali rapidinho. "Que maravilha", pensei, "poder soltar uma parte de você, deixa-lá pra trás e ainda poder regenerá-la depois? Isso é fantástico! Queria poder deixar pra trás aquela parte de mim, por livre e espontânea vontade e depois tê-la de volta, novinha em folha, sem marcas nem lembranças".

Eis que continuando a ler, descubro que quando a cauda da lagartixa cresce de novo, ela não cresce como a anterior, ela cresce menor. Onde antes existia osso - "osso? É isso mesmo? Lagartixa tem osso?"- , agora existe uma espécie de cartilagem. Sua cauda não é mais nem resistente como a outra, nem do mesmo tamanho, nem igual... A lagartixa nunca mais será a mesma, para sempre.

"Então não adiantaria ser lagartixa", voltei a pensar, "iria ser a mesma coisa de ser gente. Você perde uma parte de você. Depois, com o tempo, regenera, mas nunca volta a ser o que era. E parece que a cada regenerar, um pedaço ainda ficou pra trás pra sempre e eu nunca mais serei a mesma".

Pobre lagartixa, até parece gente.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O esquilo, a noz e o rio

Outro dia, me contaram a história do esquilo e da noz - ou do bichinho e do amendoim, sei lá. 

"O esquilo andava carregando uma noz, feliz da vida, quando, então, se depara com um rio em seu caminho. Para atravessar o rio, ele deveria deixar a noz pra trás. Mas ele estava tão feliz com a noz! Será, então, que ele deveria deixar pra lá essa idéia de atravessar e ficar por ali mesmo com sua noz? Mas... e se do outro lado do rio tivesse um monte de nozes, um banquete?! Ele só saberia se deixasse a noz que já tinha em mãos para trás..."


É isso, a vida é isso: tomar decisões. Tomar decisões sem nem sempre saber as consequências delas. E agora?! Fico na calmaria bucólica da minha zona de conforto ou parto rumo ao desconhecido sabendo que, pelo menos, uma coisa é certa: o frio na barriga existirá?! Porque de resto, atravessar o rio é partir, buscando o melhor, mas sabendo que podemos encontrar qualquer coisa - até o pior.

Tá, atravessar o rio, então, pode não dar em nada, pode me deixar sem noz e sem nada, com "fome, frio e medo" (EDUARDO, José). Mas e ficar aqui, desse lado, segurando minha noz, minha única noz, isso será o suficiente? Eu serei feliz assim?

O esquilo pensa, pensa, pensa... se joga no rio com noz e tudo, e morre afogado.

É, não dá mesmo pra ter tudo nessa vida.