quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Tempo III: medo e enfrentamento

"Você tá velha demais pra isso!", me peguei outro dia pensando a respeito de mim mesma, e quase me meto a mão na cara. Que audácia, quem eu tava achando que era pra pensar uma coisa dessas de mim mesma? E quem era eu pra pensar uma coisa dessas de mim, tão jovem que sou?

Ouço tanto isso, em tantos momentos distintos, de pessoas diversas, em relação a tanta gente. De uns tempos pra cá, ando ouvindo cada vez mais e às vezes de mim, pra mim, na minha cara, sem dó. Às vezes com dó, maquiado por metáforas e eufemismos, nem sempre menos dolorosos.

Não concordo, discordo e me enervo. Sou o que me sinto ser, não aquilo que me vêem. Vivo ainda, muitas vezes, como vivia há uma década atrás, com minhas alegrias e minha rabugentices, em meio a risadas, carinhas, chamegos, dengos, charmes, dramas. Mas agora, levo no meu lombo responsabilidades dessa uma década passada. Acordo cedo sem vitamina da mãe, trabalho até meu calo gritar e minha garganta calar, tenho horário, pago conta, choro sozinha, me dou colo, passo fome, fico com dó de mim, chamo bombeiro, eletricista, levo carro pra revisão, varro o chão. Faço planos pra um futuro próximo, regado a filhos, marido, casa própria, férias de fim de ano. Mas não abro mão das minhas birras, do sapateado com bico, de sentar num boteco sujo, de abrir um sorrisão diante de um hamburguer caprichado de fim de semana, de usar minha minissaia-camiseta-tênis. Gosto de fazer piada bocó, ler livros juvenis, ficar na piscina até ficar velhinha, desenhar e ouvir música. Sou isso tudo junto.

O mundo ao meu redor me diz que o tempo ta passando e eu estou ficando velha. Não conheço os ídolos dos meus alunos, uso palavras que eles não conhecem. Faço piadinhas pra deixá-los encabulados, e os deixo! Meodeos! Vejo todos eles fazendo as mesmas brincadeiras que já estou cansada de conhecer, perguntar sobre cúmulos que há muito já me esqueci, "o que é o que é" que já soube um dia. Quando eu já sabia bastante coisa e quase nada, muita gente que hoje me cerca ainda não existia. É o cronômetro da vida  estampado em todos os cantos pra onde olho.

Os ventos que por mim passam ainda são os mesmos, assim como a rua onde ando, as esquinas que não contorno, o cheiro de terra molhada que ando sentindo nessa mais uma primavera. No entanto, o resto todo mudou. Mas não dentro de mim em que tudo e nada mudaram ao mesmo tempo e aos poucos. Eu me sinto aquela da década passada, mas sou outra e me sinto outra também. Me perco na quantidade de mins que consigo guardar aqui dentro. E se por acaso não tenho certeza de quase nada em relação a todas essas eus de ontem-hoje-amanhã, pelo menos tenho certeza que nunca estarei "velha demais pra isso" - seja lá o que isso possa vir a ser.